O blog da fraternidade Frei Leão têm a imensa alegria de publicar nesta semana, a entrevista concedida por nosso amigo de longa data, frei Bruno, OFM. Ele nos conta um pouco de sua caminhada junto aos frades menores, nos descrevendo sua formação, desafios e curiosidades de um jovem que desde cedo optou pelo seguimento de Cristo, pelos passos de São Francisco de Assis. Confira abaixo um pequeno perfil do entrevistado.
Me chamo Frei Bruno Alexandre Scapolan, OFM. Sou natural de Barretos-SP, e tenho 29 anos. Entrei para a vida religiosa em 2002, em Franca, no período do Aspirantado, seguido do Postulantado no ano seguinte, em Olímpia. Em 2004 iniciei o período de Noviciado na casa interprovincial de Catalão (Goiás). Entre 2005 e 2007 retornei a Franca onde cursei a graduação em Filosofia. E desde 2008 moro em Marília, onde curso a graduação em teologia, da qual sou concluinte. Realizei minha profissão perpétua em 18 de setembro de 2009.
Blog Frei Leão - Você é um jovem que desde cedo testemunha a Cristo, seguindo os passos de São Francisco de Assis, e a algum tempo trabalha com os jovens, sejam os vocacionados à vida religiosa, membros de grupos de jovens, catequizandos ou irmãos jufristas. Nesse sentido, quais diferenças você destaca da vivência da sua juventude, considerando a última década, em relação à dos jovens de hoje?
Frei Bruno - A juventude de hoje se diferencia da juventude de uma década atrás. Há dez anos os jovens eram criativos, dinâmicos e com uma estabilidade maior nas suas buscas ou na opção fundamental. Hoje eu percebo jovens empreendedores e com uma autoconfiança incrível. Isso contribui para que eles se despertem mais facilmente para um direcionamento na vida. Porém, é preciso que o jovem tome consciência disso. Não sei até que ponto os avanços tecnológicos desta geração da "novidade" pode contribuir. Sem dúvidas o dado cultural da rápida transformação pode auxiliar os jovens a estarem mais "antenados" à realidade e possam responder da melhor maneira a ela. Porém, isto gera um descompromisso, pois o que é "bacana" hoje, pode se tornar chato em um curto período de tempo. Sendo assim, valores importantes e permanentes da vida podem se tornar obsoletos tais como um 'aparelho celular'. Então eu me questiono: como um jovem hoje definiria a sua opção fundamental, ou seja, aquela que vai nortear toda a sua vida. Nesta mentalidade moderna ela é possível?
Blog Frei Leão - Qual foi seu maior desafio, em relação à sua família, comunidade e amigos, ao pedir admissão à Ordem dos Frades Menores (OFM)?
Frei Bruno - No princípio a maior dificuldade foi falar para a minha família. Eu sou filho único e tinha a certeza dos vários projetos e sonhos que minha família tinha para mim. Principalmente aquele sonho de toda mãe de ser vovó. Mas eu procurei discernir primeiramente sozinho este desejo e depois quando tinha certeza da minha busca resolvi falar.
Na comunidade não foi muito difícil, pois foi com a ajuda dela que eu fui me despertando ao chamado de Deus. Partiram dela os questionamentos: "Você já pensou em ser padre?". A princípio a minha resposta era:"Deus que me livre!". Acredito que este era um mecanismo de defesa da minha consciência ao que realmente meu coração desejava. Mas o compromisso com a comunidade e as pastorais me ajudou muito neste discernimento, fazendo-me acreditar que é possível doar toda a vida a Deus, a Igreja e a Humanidade.
Com os amigos que não eram de Igreja também não foi fácil, pois eu sempre tinha receio das "piadinhas", e quando falei eles ficaram espantados, pois eu 'era' muito sapeca. E muitos não acreditavam na minha vocação dizendo que estava ficando louco. Porém, isto me fez perceber que para servir a Deus basta você ser quem é, sem se tornar outra pessoa ou usar uma máscara da piedade para isso.
Blog Frei Leão - Por que ser um frade menor hoje? Quais as motivações e os desafios envolvidos?
Diferentemente de uma tendência que vem desde os tempos dos companheiros de Francisco, onde os frades da OFM em sua maioria geralmente optam/aderem ao sacerdócio, você escolheu viver tão somente (o que não desvaloriza) sua profissão religiosa, tendo oportunidade maior de aprofundá-la. Nesse sentido, quais são seus anseios, planos, projetos a curto e médio prazo enquanto frade menor?
Frei Bruno - Ser um Frade Menor hoje é um modo radical de gritar ao mundo que o Evangelho está vivo e que é possível ser vivido. Não que não existam outras formas, mas como disse, um 'modo radical'. O desafio hoje é não deixar-se levar pelos modismos que enganam a juventude ou a sociedade num pseudo prazer e realização. Enquanto observantes da "regra e vida" evangélica a moda deve ser a do "jovem galileu" que muitas vezes é questionado e incompreendido e, não satisfeito e tranquilo, não aceitar tudo o que vem; não que neste caminho não se experimente a alegria, ela é possível mas aos moldes de São Francisco de Assis. Resumindo, o maior desafio é ser verdadeiramente testemunha evangélica.
Sobre a minha vocação de Irmão Leigo: A maioria das pessoas me questionam "-Mas só irmão?" como se faltasse algo para estar completo. Pelo contrário, ser Irmão Leigo me faz completo e realizado em minha vocação. Fico pensando como ao longo dos anos este ministério dentro da Igreja foi desvalorizado em vista de uma evangelização mais sacramentalista. No entanto, ser Irmão é viver a genuinidade do carisma franciscano, independente da opção laical ou presbiteral. São Francisco quis ser Irmão e nos deixou como herança esta riqueza. Não uma riqueza cultivada por ele mesmo, mas recebida do próprio Cristo que deixou sua majestade celeste para se fazer um de nós, experimentando nossas dores e alegrias, anseios e decepções. Se o próprio Cristo que nos deu a vida se fez irmão, e nosso pai Francisco que 'sacou' este imensurável amor, como resistir a este chamado tão especial de Deus? A vocação de irmão é a base para toda a nossa consagração religiosa, depois cada frade opta pelo seu ministério, seja leigo ou presbiteral como já disse.
Na minha opção laical, ou seja, Irmão Leigo eu procuro revelar o amor de nosso Senhor Jesus Cristo pela humanidade através primeiramente do meu testemunho de consagrado. Depois tenho os projetos que me propiciam este testemunho eficaz. A curto prazo estou me preparando para um curso master para formadores na Itália no próximo ano, no qual poderei ajudar na formação de novos frades, bem como na formação de trabalhos comunitários na Igreja.
A longo prazo penso em viver na itinerância franciscana através de missões populares, serviços com a FFB (Família Franciscana do Brasil), serviços em fraternidades inseridas, e também uma experiência de eremitério. Mas tudo vai de acordo com as necessidades dos tempos.
Blog Frei Leão - A Custódia Franciscana do Sagrado Coração de Jesus desenvolve junto às comunidades em que está inserida alguns trabalhos sociais, em sua maioria voltados á área educacional. Seguindo esse raciocínio, como você se pensa em relação ás mesmas? Como a sua vida religiosa até então pode servir a esses trabalhos?
Frei Bruno - Estes trabalhos são desafiadores, pois são uma contribuição social que damos enquanto Igreja na constituição de uma sociedade melhor no amanhã, uma vez que na sua maioria são trabalhos voltados para a educação infantil. O que me chama a atenção nestes trabalhos é a possibilidade concreta de se fazer algo pela Dignidade Humana. Não é simplesmente uma assistência, mas uma oportunidade de dar condições para que o ser humano construa o seu próprio caminho dentro de uma integridade moral.
Uma vez religioso e sendo chamado a servir em algum destes serviços, penso que o maior testemunho
é procurar o melhor para cada pessoa envolvida nestas obras, cultivando o mandamento de "amar o próximo como a mim mesmo".
Blog Frei Leão - Como um dos responsáveis pelo Serviço de Animação Vocacional (SAVOC) da Custodia, com certeza você já conheceu historias muito chamativas de jovens que procurando esse serviço, deram grande testemunho de vivência cristã e/ou franciscana. Você poderia destacar algum(s) exemplos?
Frei Bruno - Todas as experiências e histórias dos vocacionados para mim são uma riqueza, pois são experiências pessoais de Deus e que demonstram a bondade de Deus que age na história de cada um. No entanto existem histórias marcantes sim, tipo:
* Vocacionado que tem uma vida estável, com grande certeza de um futuro profissional promissor e que deixa tudo para seguir a Cristo na "incerteza" da vida religiosa. Digo isso, porque o religioso não tem estabilidades. Hoje estou aqui e amanhã podem me necessitar em um serviço totalmente diferente do que realizo.
* Há também vocacionados que passaram tempos sem participar da Igreja, ou que participavam mas sem muito engajamento, e de repente vão para um encontro de jovens ou acampamentos e começam a discernir o chamado forte de Deus num seguimento mais radical.
* Existem os que até tem namorada e que depois de conhecer o estilo dos frades e a vida franciscana, deixam tudo para ser exclusivamente de Cristo.
* Hoje tem nos procurado também algumas vocações adultas que mesmo com graduação e uma vida financeiramente tranquila, sentem que a vida ainda não está completa, e buscam no seguimento de Cristo, nos passos de Francisco de Assis, um verdadeiro valor para a vida.
* Há aqueles que tem uma vida comprometida na Igreja e percebem que Deus vai conduzindo naturalmente para esta consagração total de amor.
No entanto, cada experiência de chamamento de Deus é especial e me ajuda a refletir e revigorar o meu próprio chamado.
Blog Frei Leão - Ainda enquanto promotor vocacional, quais exemplos bíblicos de chamado de Deus você destacaria? Por que? Qual é o quer você mai se identifica? e qual modelo os jovens que você acompanha mais se identificam?
Frei Bruno - A bíblia é toda vocacional. Desde o princípio quando do barro, Deus chama o homem a vida, sem excluir é claro o chamamento de Deus para que todas as coisas existissem. No entanto a vocação de Abraão é fenomenal: "O Senhor disse a Abrão: Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei" (Gn 12, 1). Este chamado demonstra uma grande confiança e abandono em Deus. Outro chamado que me impressiona é o do profeta Jeremias: "Antes que Eu te formasse no ventre materno Eu te conheci e antes que saísses de tua mãe, eu te consagrei" (Jr 1,5). Aqui fica claro que é o próprio Deus que escolhe e envia antes mesmo de nascermos.Por fim, um chamado todo especial é do da Virgem Maria: "E, entrando o anjo aonde ela estava, disse: Salve, agraciada; o Senhor é contigo; bendita és tu entre as mulheres. Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus. E eis que em teu ventre conceberás e darás à luz um filho, e por-lhe-ás o nome de Jesus." (Lc 1, 28-31). No chamado de Jeremias vimos que Deus escolhe, este critério é a Graça de Deus (agraciada), que indica que é um favor que não merecemos, ou seja, é preciso ter humildade.
Blog Frei Leão - Você é formado em Filosofia pelo Instituto Agostiniano de Filosofia (Franca-SP) e concluinte de teologia pela faculdade João Paulo II (Marília-SP). Quais aspectos você destaca nesse seu processo de aprendizado? Quais suas recordações? Dentre tudo o que você aprendeu e apreendeu, quais pontos merecem destaque para um jovem religioso?
Frei Bruno - Sim. Na filosofia aprendi que não existem respostas fechadas. Tudo parte de um questionamento, da busca do princípio, da origem, da verdade. Nesta busca o conhecimento se revela, para alguns de um modo, para outros de outro modo. O importante é considerar o ponto de vista de cada um. Pois eu posso enxergar uma realidade de uma maneira, e o outro ver por outro ângulo. As opiniões vão divergir, mas nenhuma das partes está equivocada, o importante é somar conhecimento para que a verdade do todo se mostre mais profundamente. Portanto, quem se compromete autenticamente na busca da verdade deve levar em consideração as opiniões dos outros e aos poucos ir aprofundando neste mistério.
Falando em verdade, a teologia ensina o caminho da grande Verdade, que é o próprio Cristo. Através do caminho da Revelação, da Sagrada Tradição e do Magistério da Igreja, percorremos o caminho da salvação. No princípio o Verbo, depois na boca e ação dos profetas, até a revelação plena: o Cristo na sua encarnação. Todo este mistério inesgotável parte da Revelação de Deus ao homem até a sua plenitude na encarnação do Filho. É neste fundamento que surgem a doutrina e os dogmas, a Sagrada Liturgia, a Moral Cristã, a doutrina social da Igreja. Enfim, tudo o que diz a vida do homem que busca o seu princípio e a sua verdade.
Blog Frei Leão - São Francisco no ensina "O que temer? Nada. A quem temer? Ninguém. Por que? Porque aqueles que se unem a Deus obtém três grandes privilégios: onipotência sem poder; embriaguez, sem vinho e vida sem morte". Você já vivenciou esses três privilégios? Qual sua experiencia em relação aos mesmos?
Frei Bruno - Estes privilégios acontecem em nossas vidas a partir do momento que optamos por Deus (independente da vocação), penso que é uma consequência da nossa adesão a Cristo, porém é também o termômetro desta adesão. Quanto mais próximo de Cristo e de sua proposta, menos poder almejarei, e buscarei servir sem medidas; mais embriagado no amor de Deus e mesmo morrendo a cada dia sentiremos a vida intensamente.
Eu penso que tenho recebido estes privilégios, não na sua plenitude, mas em pequenas porções que me acompanharão até o fim de minha vida. Como eu disse: elas acontecerão mais intensamente quanto mais intensa for a minha entrega a Deus. Porém a vida toda é um caminhar para o amor de Cristo, ou seja, o Amor Ágape, e estes privilégios são os meios ou a medida do quanto se tem buscado este amor.
Blog Frei Leão - Perguntas curtinhas (Elencamos alguns sentimentos/sensações e o entrevistado destaca um momento de sua vida)
a)Alegria: "Quando ingressei no noviciado em 2004 e recebi pela primeira vez o hábito franciscano"
b)Tristeza: "Quando fiz minha última visita ao meu avô Pedro no hospital, sabendo que seria a ultima vez que o veria com vida"
c)Emoção: "Quando fiz minha profissão perpétua no dia 18 de setembro de 2009"
d)Espanto: "Quando vejo as pessoas não se importarem umas com as outras e até mesmo com a criação"
e)Solidão: "Quando entro na minha cela, ou melhor, no meu quarto - solidão positiva, de encontro comigo mesmo e com Deus"
f)Esperança:"Vários momentos, um deles é quando participo de um encontro vocacional"
g)Desilusão: "Quando vejo cristãos, leigos, religiosos, sacerdotes, não testemunhando com coerência a proposta de Cristo"
h)Amor: "Quando consigo esquecer de mim mesmo visando o bem do outro"
i)Fraternidade: "Quando percebo que as virtudes e limitações dos meus irmãos contribuem para o crescimento de todos e não de um único".
Blog Frei Leão - Nos últimos meses você juntamente com seus confrades, especialmente frei Lucas Lisi, acompanham um grupo formado por jovens e que seguindo as pegadas do Seráfico Pai, pretendem se 'configurar' segundo à estrutura fraterna da Juventude Franciscana. O que você destaca nesse grupo, e como esse tipo de trabalho contribui na formação dos frades?
Frei Bruno - Na verdade quem acompanha mais de perto a fraternidade JUFRA Santa Clara é o Frei Lucas Lisi. Mas estou sempre em contato com os membros do grupo, porque alguns já estão na formação da OFS. Destaco o valor de viver o Evangelho a exemplo de Francisco de Assis.
O amor deles a São Francisco é imenso. Outro ponto positivo é a responsabilidade e espírito de fraternidade que eles cultivam, mesmo sendo tão diferentes. A contribuição para a vida dos frades acredito que seja a possibilidade de cultivar o carisma franciscano onde nós frades não conseguimos ou não podemos estar pela nossa opção de vida. É mostrar que viver o Evangelho ao modo de São Francisco não se limita a um único estilo de vida consagrada. E o mais importante de tudo é reforçar a pertença a uma família, que é a família franciscana, construindo juntos o Reino de Deus.
Blog Frei Leão - Por fim, qual sua mensagem aos jovens que acompanham esse blog?
Frei Bruno - Cara... não seja careta... por isso, seja cristão!!!! Viva com intensidade e radicalidade a moda Cristã! Pratique a bulimia daquilo que faz o seu brother sofrer. Seja "o" ou "a" modelo mais expressivo(a) na passarela do fashion Christ. E não dê a mancada de não curtir a paz e o bem no mundo.
Gostou?
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Achei muito interessante, mas como buscar dedicar a vida a Deus se o mundo quer de nós dinheiro, ser bem sucedido, o consumismo prende muito as pessoas, mas quem sabe um dia Deus passe pelos meus caminhos e diga:"Siga-me mesmo com os seus problemas e desejos de um jovem."
ResponderExcluirDeus continuamente nos chama, muitas vezes somos nós que não ouvimos seu chamado. Se o mundo nos pede o sucesso, Deus apenas nos pede para sermos felizes, e a felicidade plena esta em servi-lo. Ninguém deixa seus problemas para trás ou mesmo deixa de ter os desejos de um jovem para seguir a Deus, simplesmente descobre em Deus uma maneira diferente de viver tudo isso. ]
ResponderExcluirAtreva-te! Ouse! Coragem!